A Revolução Industrial nos Serviços (The Industrial Revolution in Services)
A produção moderna se apoia em escala: a habilidade de usar uma tecnologia para produzir o mesmo produto, ou serviço, inúmeras vezes. Nas indústrias manufatureiras, o engenho a vapor, a eletricidade, a linha de montagem de Ford, junto com um número de outras invenções, permitiram que empresas escalassem a produção em um simples local.
Para muitos bens, as vantagens de custo de uma larga escala superaram os custos de transportar os bens aos seus consumidores finais. Esta habilidade para escalar a produção em uma única planta foi, no entanto, de pouco uso fora (ou além da) da indústria manufatureira. Produzir muitas xícaras de café, serviços de saúde ou de varejo no mesmo local não tem qualquer valor, uma vez que é impraticável levá-los aos seus consumidores finais.
A moderna escala de produção nesses setores teve que esperar por uma tecnologia diferente, uma que permitisse às empresas que elas replicassem o mesmo processo de produção em múltiplos locais perto dos consumidores.
Foi com esse diagnóstico que Chang-Tai Hsieh e Esteban Rossi-Hansberg, em recente trabalho para o National Bureau of Economic Research- NBER, argumentaram que as novas tecnologias de informação e comunicação- TICs finalmente permitiram que fosse possível para empresas fora do setor da indústria manufatureira escalassem a produção para um amplo número de localizações.
A expansão resultante levou a um aumento na participação no mercado nacional de empresas top em muitos setores. Ou seja, tudo isso é resultado de uma “nova revolução industrial” que aconteceu em muitos setores de serviços “non-traded” (não comercializáveis) — como é tradicionalmente reconhecida a maioria dos serviços na economia.
Os autores nos brindam com dois exemplos singulares. O primeiro é o de como a Cheesecake Factory trouxe uma “produção em cadeia para complicadas refeições sit-down” (em restaurantes)(*). A empresa investiu em tecnologias para determinar o tamanho ótimo do staff e de compras de comidas para cada restaurante a cada dia. Ela tem um processo bem “azeitado” pelo qual introduz novos itens nos seus menus.
Esse processo começa em uma “cozinha” centralizada em Calabasas, CA — seu “P&D Lab”, se assim se pode chamar — onde mestres de cozinha dos top cheesecakes produzem ideias para novos pratos e imaginam como fazer cada receita “reproduzível, apelativa, e acessível do ponto de vista econômico”. Os mestres no “lab” ensinam as novas receitas para os gestores das cozinhas de cada restaurante em um encontro bianual na Califórnia. Os gestores de cozinhas seguem um procedimento finamente preparado para ensinar as novas receitas aos mestres em cada restaurante. O intervalo de tempo entre a ida dos gerentes ao lab e a chegada dos novos pratos nos menus de cada restaurante é de sete semanas.
A padronização da produção ao longo de um amplo número de estabelecimentos que aconteceu em refeições de restaurantes devido a empresas tais como a Cheesecake Factory aconteceu em muitos serviços non-traded. Os autores citam hospitais como outro exemplo. Quatro décadas atrás, em torno de 85% dos hospitais nos EUA eram simples estabelecimentos sem fins lucrativos. Hoje, mais de 60% dos hospitais são de propriedade de redes lucrativas, ou são parte de uma ampla rede de hospitais de propriedade de uma instituição acadêmica (tais como a University of Chicago Hospitals).
Como um exemplo do primeiro caso, os autores apontam o Steward Health Care Group. Esta companhia foi criada pelo fundo de private equity chamado Cerberus em 2010, quando comprou 6 hospitais católicos em Boston. A meta do Cerberus era criar a “Sothwest Airlines dos cuidados da saúde”, ao observar e codificar as melhores práticas e implementar tais práticas em larga escala.
Os autores citam (referência de outro pesquisador) ainda uma cena na remote intensive care unit (ICU) — unidade remota de cuidados intensivos — do Steward em subúrbio de Boston que monitora as ICUs de todos os hospitais do Steward:
“Bancos das telas dos computadores conduziam leituras de monitores cardíacos ao vivo, scans de imagens radiológicas, e resultados de laboratório dos pacientes da ICU através dos hospitais do Steward. Software monitoravam os fluxos e produziam alertas vermelhos e amarelos quando eles detectavam padrões e acionavam alertas. Médicos e enfermeiros controlavam consoles onde eles poderiam alternar câmeras de vídeo de alta definição que os permitissem fazer zoom dentro de qualquer sala de ICU e falar diretamente para o staff na cena ou para os próprios pacientes”.
Tecnologias tais como as das ICUs remotas possibilitaram que o Steward ofertasse cuidado consistente em todas as ICUs em seus hospitais. Em 2019, o Steward expandiu de 6 hospitais originais em Boston para 36 hospitais localizados em 9 estados e em malta.
Em resumo, o que os autores defendem (assim como nós da Creativante há muitos anos) é que o crescimento da concentração econômica é devido a companhias similares à Chesseckae Factory e ao Steward Healthcare que adotaram tecnologias que as capacitaram a padronizar e escalar a entrega deserviços non-traded. Mais detalhes sobre o trabalho aqui comentando serão vistos em outra oportunidade!
Desta forma, o argumento de alguns profissionais, de que o fenômeno da desindustrialização (que está ocorrendo no mundo inteiro) é um “desastre” para economias como a do Brasil, é um total desconhecimento do fenômeno aqui tratado da “revolução industrial nos serviços”, devido, marcadamente, às novas TICs e aos novos modelos de negócios que delas emanam!
Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre a revolução industrial nos serviços, não hesite em nos contatar!
(*) A título de conhecimento, a Cheesecake Factory é uma produtora e distribuidora de cheesecake (e outras sobremesas), com sede na Califórnia-CA/EUA, para mais de 100 restaurantes, e cujo faturamento em 2016 foi de mais de dois bilhões de dólares.